quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Texto de Georg Simmel parte 1

AS GRANDES CIDADES E A VIDA DO ESPÍRITO
(1903)
Georg Simmel
O fundamento psicológico sobre o qual se eleva o tipo das individualidades da cidade grande é a intensificação da vida nervosa, que resulta da mudança rápida e ininterrupta de impressões    interiores e exteriores.
O homem é um ser que faz distinções, isto é, sua consciência é estimulada mediante a distinção da impressão atual frente a que lhe precede. As impressões persistentes, a insignificância de suas diferenças, a regularidade habitual de seu transcurso e de suas oposições exigem por assim dizer
menos consciência do que a rápida concentração de imagens em mudança, o intervalo ríspido no interior daquilo que se compreende com um olhar, o caráter inesperado das impressões que se impõem. Na medida em que a cidade grande cria precisamente estas condições psicológicas — a cada saída à rua, com a velocidade e as variedades da vida econômica, profissional e social —, ela propicia, já nos fundamentos sensíveis da vida anímica, no quantum da consciência que ela nos exige em virtude de nossa organização enquanto seres que operam distinções, uma oposição profunda com relação à cidade pequena e à vida no campo, com ritmo mais lento e mais habitual, que corre mais uniformemente de sua imagem sensível-espiritual de vida. Com isso se compreende sobretudo o caráter intelectualista da vida anímica do habitante da cidade grande, frente ao habitante da cidade pequena, que é antes baseado no ânimo e nas relações pautadas pelo sentimento. Pois estas lançam raízes nas camadas mais inconscientes da alma e crescem sobretudo na calma proporção de hábitos ininterruptos. Em contraposição a isto, o lugar do entendimento são as camadas mais superiores, conscientes e transparentes de nossa alma; ele é, de nossas forças interiores, a mais capaz de adaptação. Ele não necessita, para acomodar-se com a mudança e oposição dos fenômenos, das comoções e do revolver interior, sem os quais o ânimo mais conservador não saberia se conformar ao ritmo uniforme dos fenômenos. Assim, o tipo do habitante da cidade grande — que naturalmente é envolto em milhares de modificações individuais — cria um órgão protetor contra o desenraizamento com o qual as correntes e discrepâncias de seu meio exterior o ameaçam: ele reage não com o ânimo, mas sobretudo com o entendimento, para o que a intensificação da consciência, criada pela mesma causa, propicia a prerrogativa anímica. Com isso, a reação àqueles fenômenos é deslocada para o órgão psíquico menos sensível, que está o mais distante possível das profundezas da personalidade. Essa atuação do entendimento, reconhecida portanto como um preservativo da vida subjetiva frente às coações da cidade grande, ramifica-se em e com múltiplos fenômenos singulares.

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